sábado, 19 de fevereiro de 2011

Informativo Jurídico - 18.FEV.2011


LEITURA RECOMENDADA (Lançamentos Jurídicos)

DIREITO CIVIL BRASILEIRO - DIREITO DE FAMILIA - 8ª EDIÇÃO - 2011CARLOS ROBERTO GONÇALVES - Editora Saraiva

CONSTITUIÇÃO DO BRASIL INTERPRETADA E LEGISLAÇÃO CONSTITUCIONAL - 8ª EDIÇÃO – 2011

INSTITUIÇÕES DE DIREITO CIVIL - TEORIA GERAL DAS OBRIGAÇÕES -  24ª EDIÇÃO – 2011 - CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, GUILHERME CALMON N.D - Editora Forense Jurídica (Grupo GEN)

SOBERANIA DO ESTADO E PODER DE POLÍCIA – 2011 - HERALDO GARCIA VITTA - Editora Malheiros

A NOVA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E O DIREITO ADMINISTRATIVO – 2011 - BRUNO MIRAGEM - Editora Revista dos Tribunais

O NOVO SISTEMA JURIDICO PENAL - UMA INTRODUÇÃO A DOUTRINA DA AÇÃO FINALISTA - 2ª EDIÇÃO – 2011 - HANS WELZEL - Editora Revista dos Tribunais

NOVOS PARADIGMAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL - 3ª EDIÇÃO – 2011 - ANDERSON SCHREIBER - Editora Atlas

DIREITO PREVIDENCIÁRIO NA VISÃO DOS TRIBUNAIS : DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA - BERNARDO, LEANDRO FERREIRA; FRACALOSSI, WILLIAM - Editora: Método : Gen - 2 ed. – 2010

PROMESSA DE COMPRA E VENDA E PARCELAMENTO DO SOLO URBANO : LEIS 6.766/79 E 9.785/99 - RIZZARDO, ARNALDO - Editora: Revista dos Tribunais - 8 ed. - 2010


JURISPRUDÊNCIA

PLANO DE SAÚDE - APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - TRATAMENTO ONCOLÓGICO - CIRURGIA DE RECONSTRUÇÃO MAMÁRIA - PRÓTESE DE SILICONE - PROCEDIMENTO NÃO ESTÉTICO - COBERTURA DEVIDA
- O art. 12 da Lei nº 9.656/98 estipula quais serviços devem ser obrigatoriamente cobertos pelos planos de saúde, e, dentre eles, estão incluídas as próteses e órteses necessárias e ligadas a procedimentos cirúrgicos.
- Comprovada a necessidade da realização de cirurgia para reconstrução mamária, com o uso de prótese de silicone, após retirada total da mama para tratamento contra o câncer, é dever do plano de saúde cobrir as despesas decorrentes do tratamento, mesmo que o contrato não tenha sido adaptado à Lei nº 9.656/98, por se tratar de procedimento indispensável ao pleno restabelecimento físico e psicológico da paciente.
Recurso não provido. (Apelação Cível n° 1.0713.08.088662-3/001 - Comarca de Viçosa - Apelante: Unimed Viçosa Cooperativa de Trabalho Médico Ltda. - Apelada: Dalva Vieira de Aguiar - Relator: Des. Gutemberg da Mota e Silva)

APELAÇÃO CRIMINAL - ART. 157, § 3º, DO CÓDIGO PENAL - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - DESCLASSIFICAÇÃO PARA HOMICÍDIO - IMPOSSIBILIDADE - ESBULHO POSSESSÓRIO - ÂNIMO DO AGENTE - OCULTAÇÃO DE CADÁVER - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA - AUTODEFESA - TIPICIDADE AFASTADA
- Inviável proceder à desclassificação do latrocínio para o crime de homicídio na hipótese em que o resultado morte decorre de violência empregada pelo acusado com a finalidade de obter vantagem patrimonial, consistente no apoderamento não apenas da casa da vítima, mas de todos os seus pertences, incluindo carteira, documentos pessoais, cartões bancários e objetos pessoais.
- Uma vez demonstrado que o dolo do acusado era livrar-se da imputação e não de acusar injustamente um inocente, não há como condená-lo pela prática do delito de denunciação caluniosa.
- Exige-se, para configuração do esbulho, além da violência ou ameaça, o concurso de duas ou mais pessoas.  (Apelação Criminal n° 1.0313.09.284791-9/001 - Comarca de Ipatinga - Apelante: José Antônio Pereira - Apelado: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Relator: Des. Renato Martins Jacob)


AÇÃO DE COBRANÇA DE CORRETAGEM - CONFISSÃO FICTA - NÃO OCORRÊNCIA - AUSÊNCIA DE EXCLUSIVIDADE - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO - COMISSÃO DEVIDA APENAS À CORRETORA QUE FINALIZOU O NEGÓCIO
- Inexistindo exclusividade para a venda de imóvel, a comissão de corretagem será devida àquela que concretizou a venda, ainda que outra tenha chegado a mostrar o bem ao comprador final.
- Para ensejar a remuneração da comissão de corretagem o negócio deve alcançar seu resultado útil, ou seja, a venda.
- A mera apresentação do imóvel pelo corretor do vendedor ao comprador não gera o direito à comissão.  (Apelação Cível n° 1.0024.07.576522-2/001 - Comarca de Belo Horizonte - Apelante: VPR Imóveis Ltda. - Apeladas: Gramo Empreendimentos e Construções Ltda., GR Corretora de Imóveis Ltda. - Relator: Des. Arnaldo Maciel)


SERVIDOR TEMPORÁRIO - ART. 37, IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - MATÉRIA DE COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM - DECISÃO DO STF - EXCEPCIONAL INTERESSE PÚBLICO - EXERCÍCIO DE FUNÇÃO PÚBLICA - NATUREZA PRECÁRIA E TEMPORÁRIA DO VÍNCULO - VERBAS TRABALHISTAS - CLT - INAPLICABILIDADE - LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 002/93 - SUBMISSÃO AO REGIME ESTATUTÁRIO
- Ao servidor em exercício de função pública, contratado em caráter precário e temporário, para atender interesse temporário e excepcional do Poder Público, não se aplicam as disposições da Consolidação das Leis do Trabalho.
- Em razão de o serviço público ser firmado na intenção de estabilidade, não se adota o FGTS, sendo que, em caso de dispensa do servidor temporário, o funcionário somente faz jus às verbas estatutárias.  (Apelação Cível n° 1.0407.09.023545-5/001 - Comarca de Mateus Leme - Apelante: Hamilton Luciano Pinto - Apelado: Município de Juatuba - Relatora: Des.ª Sandra Fonseca)

ADMINISTRATIVO - BHTRANS - SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA - PRECEDENTE DO STJ - APLICAÇÃO DE MULTAS - SUSPENSÃO DOS EFEITOS DAS INFRAÇÕES
- O colendo Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento de Recurso Especial n° 817.534/MG, decidiu, por unanimidade, que a BHTrans não tem poder para aplicar multas de trânsito em Belo Horizonte.
- Ante o receio de dano ao condutor e das graves restrições decorrentes das anotações de pontos no prontuário do interessado, alternativa não há senão a de suspender os efeitos das infrações até ulterior julgamento da lide.  (Agravo de Instrumento Cível n° 1.0024.10.002318-3/001 - Comarca de Belo Horizonte - Agravante: Carlos Alberto Baltazar de Oliveira - Agravada: BHTrans Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte S.A. - Relator: Des. André Leite Praça)


SENTENÇA
SENTENÇA – EMBARGOS DE TERCEIRO – SUBADQUIRENTE DE BOA-FÉ – AÇÃO PAULIANA – SENTENÇA EFEITOS


 
S E N T E N Ç A

 
Na Comarca de xxxxxxxxxxxx, MG, xxxxxxxxxxxx, representado pelo nobre advogado Dr. xxxxxxxxxxxx, opôs, aos xxxxxxxxxxxx, embargos de terceiro em face de xxxxxxxxxxxx e xxxxxxxxxxxx, no bojo dos quais pediu fosse concedida medida liminar de manutenção de posse em seu favor.

Como causa de pedir, aduziu ser legítimo proprietário de imóvel rural situado na localidade de xxxxxxxxxxxx, Distrito de xxxxxxxxxxxx, na cidade de xxxxxxxxxxxx, MG, tendo adquirido o bem da pessoa de xxxxxxxxxxxx, aos 08.DEZ.2008, mediante contrato particular de permuta de bens imóveis.

Narrou que, à época do negócio, não havia nenhum gravame sobre o bem adquirido, propugnando sua condição de adquirente de boa-fé.  Noticiou que no bem litigioso fez erigir benfeitorias de elevado valor.

Sustentou o diminuto valor atribuído ao bem pelo Oficial de Justiça Avaliador.

Com a petição inicial vieram Escritura Pública de Transmissão de Imóvel Rural, lavrada nas notas do Cartório do xxxxxxxxxxxx aos 20.AGO.2002, em que figuram como partes contratantes xxxxxxxxxxxx e xxxxxxxxxxxx; e Escritura Pública de Permuta de Bens lavrada nas notas do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Notas do Distrito xxxxxxxxxxxx, xxxxxxxxxxxx, aos 02.FEV.2009, em que figuram como partes xxxxxxxxxxxx e xxxxxxxxxxxx, ora embargante.

Em apenso, tramitam autos de liquidação por arbitramento e de indenização, esta em fase executiva.

Emenda à petição inicial às folhas 23-24, deu-se à causa o valor de R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais).

Indeferido o pedido de Assistência Judiciária Gratuita, as custas foram recolhidas à folha 39.

Pela decisão de folhas 41-44, deferi a liminar ambicionada.

Em sua resposta de folhas 86-93, o embargado xxxxxxxxxxxx narrou que se sagrou vencedor em ação pauliana movida em face de xxxxxxxxxxxx e de xxxxxxxxxxxx, razão pela qual obteve a anulação da venda que aquele fizera a este, relativamente ao imóvel objeto da constrição judicial e cuja posse e propriedade são reivindicadas pelo embargante.

Sustentou, em síntese, que a declaração de ineficácia do negócio jurídico, in casu, ao manter intocado o negócio tisnado pela fraude, teria o condão de salvaguardar os interesses do adquirente de boa-fé em relação ao vendedor, que o adquirira in fraudem creditoris.  Corolário, o vencedor na ação revocatória teria, segundo propugnou, “direito incontestável de que a penhora recaia sobre o bem que fora objeto do negócio impugnado, ainda que o mesmo já se encontre em poder de terceiros, como ocorre neste feito.” (folha 89).

Embora regularmente citado (fólio 102), quedou-se inerte o segundo embargado.

É o RELATÓRIO do quanto necessário.  Passo a FUNDAMENTAR e DECIDIR.

As questões de fato encontram-se sobejamente demonstradas, razão pela qual o prosseguimento do feito faz-se desnecessário.  O caso é, de fato, de julgamento conforme o estado do processo.

Não há nulidades a serem sanadas ou conhecidas de ofício.

Há, todavia, questão prévia que devo enfrentar neste comenos.

O bem constritado encontra-se registrado em nome do embargante, tendo sido adquirido da pessoa de xxxxxxxxxxxx.  A indicação do bem à penhora fora feita pelo próprio primeiro demandado, que executa sentença em autos de ação indenizatória que promovera em face do segundo embargado.

Em casos tais, a legitimidade passiva ad causam é atribuída unicamente ao sedizente credor que é, ao fim e ao cabo, aquele que suportará os agravos de eventual procedência do pedido veiculado nos autos dos embargos de terceiro.

Como é incontroverso, a sentença proferida em sede de ação pauliana não determina o retorno do bem alheado ao cabedal do vendedor animado pelo intento fraudatório, determinando apenas a ineficácia relativa e sucessiva da alienação em relação ao credor.

Nesse sentido, confira-se, ipsissima verba, mas com os grifos por mim adicionados:

RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL - IMÓVEL - CONTRATO DE COMPRA E VENDA NÃO-REGISTRADO – PENHORA – EMBARGOS DE TERCEIRO – LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM – LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO ENTRE O DEVEDOR E O CREDOR – INEXISTÊNCIA – CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA – PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE.
I - Nas hipóteses em que o imóvel de terceiro foi constrito em decorrência de sua indicação à penhora por parte do credor, somente este detém legitimidade para figurar no polo passivo dos Embargos de Terceiro, inexistindo, como regra, litisconsórcio passivo necessário com o devedor.
II - O princípio da causalidade não se contrapõe ao princípio da sucumbência. Antes, é este um dos elementos norteadores daquele, pois, de ordinário, o sucumbente é considerado responsável pela instauração do processo e, assim, condenado nas despesas processuais. O princípio da sucumbência, contudo, cede lugar quando, embora vencedora, a parte deu causa à instauração da lide.
III – Se o credor indicou à penhora imóvel objeto de contrato de compra e venda não registrado, é iniludível que a necessidade do ajuizamento dos embargos de terceiro pelo adquirente é resultado da desídia deste em não promover o registro, providência que a par da publicidade do ato poderia evitar a indesejada constrição
patrimonial, haja vista a eficácia erga omnes dos atos submetidos a registro. Assim, face ao princípio da causalidade, cabe ao terceiro-embargante, adquirente do imóvel, arcar com os consectários da sucumbência.
Recurso Especial a que se dá provimento parcial. (STJ, 3ª Turma, REsp 282674, relatora a Minª NANCY ANDRIGHI, in DJ de 07.MAI.2001, p. 140)

Por tais razões, extingo o feito sem resolução do mérito (Código de Processo Civil (CPC), artigo 267, inciso VI) em relação a xxxxxxxxxxxx, deixando de condenar o embargante em honorários advocatícios por não se ter aperfeiçoado, em relação ao demandado, o contraditório.

Repontando-se para a hipótese vertente, passo a lançar breve escorço sobre os eventos relevantes para a exata compreensão da controvérsia.

No dia 20.MAR.2000, o embargando moveu, em face de xxxxxxxxxxxx, demanda sob procedimento comum ordinário em que pleiteou a condenação deste no pagamento de certa soma em dinheiro, por haver sofrido tentativa de homicídio que lhe ocasionou danos diversos.

Após célere tramitar, a pretensão foi julgada procedente, mercê do desprovimento dos recursos pelo egrégio Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais (julgamento aos 25.JUN.2002).

Quanto à parte líquida, deflagrou-se processo de execução de sentença, nos moldes precedentes à sistemática inaugurada pela Lei nº 12.232, de 2005, aos 13.DEZ.2005; quanto à parte ilíquida, há liquidação por arbitramento ainda em trâmites.

Baldados os esforços de localização de bens do devedor, foi a execução suspensa aos 11.NOV.2008, até porque tramitava a indigitada ação pauliana, julgada procedente por força de venerando acórdão proferido no autos da Apelação Cível nº xxxxxxxxxxxx, cuja ementa encontra-se vazada nos seguintes termos, verbatim:

(omissis)

O acórdão foi publicado na Sessão do dia 09.JUN.2009, transitando livremente em julgado.

Pois bem.

O embargante veio a adquirir o bem constritado por escritura pública de permuta lavrada nas notas do Cartório do Registro Civil de Pessoas Naturais e Tabelionato de Notas do Distrito de xxxxxxxxxxxx aos 02.FEV.2009, vindo o ato a ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis da Cidade de xxxxxxxxxxxx três dias depois, ou seja, quatro meses antes de prolatado o acórdão pelo egrégio Sodalício mineiro.

Assim, revela-se anódina a melindrosa questão, à qual fiz referência quando da concessão da medida liminar, se a demanda revocatória teria cariz anulatório, como parece à doutrina ainda majoritária, ou se a revocatória (que de revocatória não se cuidaria, na acepção técnica do termo) engendraria apenas a ineficácia do negócio fraudulento vis a vis o credor prejudicado.

É que, num como noutro caso, os efeitos da sentença não retroagiriam para invalidá-lo ou torná-lo ineficaz ab ovo, mas somente incidiriam a partir do reconhecimento judicial do conluio fraudulento.

Eis a tersa lição de CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON ROSENVALD, na já festejada obra “Direito Civil – Teoria Geral” , litteratin, mas com grifos não constantes do original:

A natureza da sentença pauliana parecer ser, para o entendimento tradicionalmente esposado pela doutrina brasileira (que patrocina a anulabilidade do negócio), constitutiva negativa (desconstitutiva).  É que o negócio fraudulento praticado produzirá regulares efeitos até que advenha o trânsito em julgado da sentença revocatória, somente permitindo-se ao credor buscar o bem no patrimônio do terceiro adquirente após a formação da coisa julgada (vale dizer, a sentença pauliana restaura a possibilidade de incidência sobre o bem alienado da responsabilidade patrimonial).

Conquanto perfilhe a tese da ineficácia, quanto à eficácia prospectiva da sentença pauliana, assim também pontifica o insigne e nunca assaz citado CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, no clássico contemporâneo “Fundamentos do Processo civil Moderno” :

Em certa medida, a ineficácia sucessiva guarda analogia com a anulabilidade do negócio jurídico. Diferem, no plano teórico, primacialmente porque a ineficácia (em sentido estrito) não se refere ao ato em si mesmo, mas diretamente aos efeitos do ato; e a invalidade, em cujo conceito se contém a anulabilidade, é a imperfeição do ato. No plano prático, a ineficácia sucessiva difere na anulabilidade (especialmente no que concerce ao negócio eivado de fraude) na sua extensão objetiva e subjetiva, de modo que, quando se torna operativa sobre o negócio, não o torna irrelevante, mas apenas reduz o leque dos efeitos originariamente produzidos.

Em outra consagrada obra , é ainda mais diáfano o atilado mestre paulista, verbis:

O subadquirente de boa-fé não fica atingido pela fraude ocorrida no negócio precedente (ou seja, na venda do devedor ao conluiado), desde que haja adquirido antes de julgada procedente a ação pauliana. Isso é conseqüência direta da configuração de ineficácia sucessiva, ou ulterior, como efeito da fraude contra credores.


Tollitur quaestio.

Eis também a dicção legal (Código Civil brasileiro, artigos 165 e 177) e a jurisprudência emanada do egrégio Superior Tribunal de Justiça:

EMBARGOS DE TERCEIRO - FRAUDE CONTRA CREDORES - FRAUDE À EXECUÇÃO.
Consoante a doutrina tradicional, fundada na letra do Código Civil, a hipótese é de anulabilidade, sendo inviável concluir pela invalidade em embargos de terceiro, de objeto limitado, destinando-se apenas a afastar a constrição judicial sobre bem de terceiro.
De qualquer sorte, admitindo-se a hipótese como de ineficácia, essa, ao contrário do que sucede com a fraude de execução, não é originária, demandando ação constitutiva que lhe retire a eficácia.
A fraude à execução só se caracteriza  quando existe uma lide pendente e, para que isso ocorra, mister a citação. O simples ajuizamento da ação não induz a litispendência. (3ª Turma, REsp 122523, relator o Min. EDUARDO RIBEIRO, DJ de 08.MAR.1999, p. 217)

Exalce-se, por postremeiro, que a boa-fé do embargante é presumida.  Ao que tudo indica, cuida-se de terceiro absolutamente estranho ao conluio fraudulento que, sem saber da existência da demanda revocatória, permutou bens de sua propriedade, livres e desembargados, de elevado valor, situados em vizinha comarca.

De toda e qualquer sorte, eventual má-fé do embargante não seria passível de cognição nesta angusta sede de embargos de terceiro, devendo ser objeto de nova demanda, consoante entendimento já firme do egrégio Superior Tribunal de Justiça, consolidado no verbete nº 195 da Súmula de sua jurisprudência predominante.

Sobre o necessário resguardo dos interesses de terceiros de boa-fé que não contribuíram para o ato inquinado de invalidade, trago a lanço, vez mais, as ensinanças de CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON ROSENVALD , com supressões decorrentes da síntese:

[...] É que não faz sentido prejudicar o terceiro de boa-fé (diligente, sério e cuidadoso) que, em confiança e com as necessárias cautelas, adquiriu um direito cuja perfeita regularidade era evidente (embora não real).  Tal situação importaria verdadeiro caos, em total instabilidade, nas relações sociais, especialmente nos negócios de compra e venda.
Em página magistral, ALBERTO TRABUCCHI analisa a questão, em capítulo bem intitulado La tutela dell'affidamento (ou seja, a tutela da confiança), concluindo, a partir do novos paradigmas que norteiam o Direito Civil, que “as exigências da vida impõem uma aplicação mais humana e menos rígida dos dogmas e princípios e, dentro dessa linha, no Direito moderno, aprecia-se o fato de que também criar aparências de realidade contratual ou permitir que estas se criem implica o nascimento de situações que, como consequência imediata, não devem prejudicar os que, no mundo negocial, confiam nessas aparências, dignas de crédito.  A proteção da boa-fé baseia-se, especialmente, nessa valoração objetiva das situações, quando o interessado tinha motivos para fiar-se nas aparências”.
[...]
Em última análise, inclusive, a consagração da tutelado direito aparente (pelo adquirente de boa-fé) traz como pano de fundo a própria exigência de um comportamento ético pelos contratantes (boa-fé objetiva).

Tais achegas ficam apenas como argumento adicional para a procedência da pretensão, pois que restou cumpridamente demonstrado que a aquisição do bem penhorado pelo embargante deu-se anteriormente ao decreto de sua invalidade (ou de sua ineficácia sucessiva) pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, consoante demonstrado pela cinemática dos eventos acima delineada.

Nessa ordem de considerações, extingo o processo com resolução do mérito (Código de Processo Civil, artigo 269, inciso I) para julgar PROCEDENTE o pedido para desconstituir a penhora efetivada sobre o imóvel a que se refere o auto de penhora, avaliação e depósito de folha 324 dos autos nº xxxxxxxxxxxx, expedindo-se, em favor do embargante, mandado de manutenção de posse.

As custas serão rateadas entre as partes, considerando que houve, em relação ao corréu xxxxxxxxxxxx, extinção do feito sem resolução do mérito.

Condeno o embargado xxxxxxxxxxxx no pagamento de 50% (cinquenta por cento) das custas processuais e na verba honorária que, atento aos parâmetros do artigo 20, §3º do Código de Processo Civil (CPC), notadamente o exíguo número de petições e ausência de audiências, fixo em R$ 2.100,00 (dois mil e cem reais).

Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.

PEDRO C. RAPOSO LOPES
Juiz de Direito



NOTÍCIAS (Fontes:  informativos do Superior Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunal de Justiça)

Precatório oferecido à penhora pode ser recusado pelo fisco
O precatório não se equipara a dinheiro ou fiança bancária, mas a direito de crédito, e por isso a Fazenda Pública pode recusar a oferta desse bem à penhora em substituição a outro. A recusa vale para os casos legais (artigo 656 do Código de Processo Civil), tal qual a desobediência da ordem de bens penhoráveis prevista no artigo 11 da Lei de Execução Fiscal (Lei n. 6.830/1980) e a baixa liquidez dos bens.  O entendimento foi reafirmado pela Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de um recurso especial da Fazenda do Estado de São Paulo. O relator é o ministro Mauro Campbell Marques.  O fisco estadual protestava contra decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que, em uma ação de execução contra uma empresa de comércio internacional, havia considerado inadmissível a recusa da nomeação de precatório judicial expedido à Fazenda do Estado. Na mesma decisão, o TJSP havia determinado o desbloqueio de ativos financeiros da empresa, penhorados via Bacenjud – o sistema de envio de ordens judiciais pela internet ao Sistema Financeiro Nacional.  Ao manifestar seu posicionamento, o ministro Campbell observou que a execução é feita no interesse do credor. Ele lembrou o julgamento de recurso repetitivo sobre o tema, definido em 2009. No Recurso Especial 1.090.898, relatado pelo ministro Castro Meira, a Primeira Seção definiu que o precatório é penhorável, mesmo que a entidade dele devedora não seja a própria exequente. No entanto, o precatório equivale à penhora de crédito, não a dinheiro ou fiança bancária. Assim, a Fazenda Pública pode recusar a sua substituição por quaisquer das causas previstas no CPC ou na LEF.  (Coordenadoria de Editoria e Imprensa)

Sócio avalista não pode recorrer em lugar de empresa que perdeu prazo
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou decisão do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) para definir que o sócio avalista de uma empresa não tem legitimidade para apresentar apelação própria, na condição de terceiro interessado, depois que a apelação da pessoa jurídica – autora da ação julgada improcedente na primeira instância – foi dada por intempestiva.  A admissão da tese de apelação substitutiva do avalista, discutindo a intimidade do negócio principal, à ausência de apelação da parte vencida, significaria abrir fácil via de questionamento de qualquer processo judicial em que houvesse a figura do avalista”, declarou o ministro Sidnei Beneti, relator do caso, considerando que essa hipótese traria grande tumulto processual. Seu voto foi acompanhado integralmente pela Turma julgadora.  O processo envolve intrincado negócio em torno de uma fazenda de cinco mil hectares, vendida por uma empresa agropecuária a um comprador que, como parte do pagamento, comprometeu-se a quitar dívida da vendedora com o Banco do Nordeste. O financiamento era garantido perante o banco por aval do sócio diretor da empresa vendedora.  O desentendimento entre as partes surgiu depois que o comprador, usando procuração outorgada pela vendedora (devedora perante o banco), renegociou o financiamento para o prazo de vinte anos, o que impediu que o sócio da agropecuária pudesse ficar livre do aval.  A ação. A vendedora ajuizou ação pedindo a rescisão do contrato, reintegração na posse da fazenda e indenização por danos morais e materiais. A ação foi julgada improcedente na primeira instância, contra o que a agropecuária apelou ao TJBA, mas o recurso foi considerado intempestivo.  Na sequência, invocando sua condição de terceiro interessado – porque seria prejudicado pela sentença –, o sócio avalista apresentou apelação em nome próprio e conseguiu que o TJBA derrubasse a decisão de primeira instância. Além da rescisão contratual e da reintegração na posse, foi determinado o pagamento de indenizações pelo comprador, em favor da vendedora, no valor de 50 salários-mínimos, por danos morais, e de R$ 3,2 milhões, por danos materiais.  O ministro Sidnei Beneti observou que a apelação oferecida pelo avalista “é rigorosamente a mesma” que havia sido apresentada pela empresa e que não foi conhecida pelo tribunal estadual, tendo o mesmo texto, a mesma disposição gráfica e a assinatura do mesmo advogado. Foi acrescentada apenas uma página de introdução para tentar justificar a presença do avalista no processo.  Para o relator, “é patente a configuração de tentativa de contornar o não conhecimento da apelação da autora [a empresa] por intermédio da atividade processual oblíqua do sócio avalista”. O ministro comentou que admitir o sócio da agropecuária como terceiro recorrente, quando a autora originária não apelou, “significaria muito mais do que intervenção recursal de terceiro, mas sim reconhecimento de legitimidade extraordinária superveniente à sentença, instituto inexistente no direito processual”.  Segundo o ministro, em apelação de terceiro, sob o fundamento de ser sócio avalista, não haveria nenhuma possibilidade de se discutirem questões como rescisão contratual principal, reintegração de posse e pagamento de indenizações, da forma como o fez o TJBA, “ultrapassando os limites de discussão do aval”.  (Coordenadoria de Editoria e Imprensa)

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